No início deste ano, Rafael Oliveira, gerente de comunicação e marketing da Unimed-Rio e professor na ESPM-Rio, Escola Aberje e FGV, lançou o curso “Liderança para Profissionais de Comunicação“. São 12 horas de imersão on-line, fruto de muito estudo sobre o tema ao longo dos últimos anos.
Jornalista, com mestrado em Gestão da Economia Criativa e MBA em Comunicação Corporativa pela ESPM Rio e mais de 20 anos de experiência nas áreas de comunicação e marketing, ele conta que a origem do seu interesse pelo assunto veio do esporte.
Acompanhando equipes campeãs, percebia que por trás do sucesso estava o talento dos jogadores, mas, também, uma capacidade de influenciar as pessoas a fazerem o que precisava ser feito. No mercado de trabalho, no entanto, os profissionais em geral se preparavam muito para atividades técnicas em cursos e MBAs, mas quando se tornavam líderes, exerciam a função a partir de referências passadas e intuição. Reconheceu a si mesmo neste perfil, sem um preparo ou capacitação específicos. Na busca por modelos, ferramentas e frameworks para líderes, Rafael se surpreendeu com a quantidade de conhecimento existente.
Diante disso, ele decidiu organizar as diversas referências que obteve no próprio processo de capacitação e colocou a serviço dos outros.
“Adoraria ter tido essa oportunidade quando estava no início da minha trajetória”, afirma.
Aqui, ele conta um pouco do que aprendeu sobre o assunto.
Qual a sua definição de um bom líder?
Rafael – Um bom líder é aquele que entrega os resultados desejados a partir da criação de um ambiente sadio de trabalho para um grupo de pessoas talentosas fazerem o seu melhor. Parece simples, mas passa por muitas questões complexas, como apresentar um propósito inspirador capaz de reunir pessoas diferentes com visões comuns, estabelecer uma cultura pautada na confiança e na segurança psicológica, dar às pessoas orientações e desafios que promovam o desenvolvimento de carreira de cada um e do grupo como um todo e ter uma comunicação extremamente clara e assertiva, entre tantos outros pontos.
Como esta definição se transformou ao longo de anos mais recentes, especialmente pós-pandemia?
Rafael – No século passado, a liderança era ocupada pelas pessoas que sabiam mais. O chefe era aquele que ficava anos em um determinado cargo, era reconhecido por sua competência técnica e era promovido. Ele é o mais bem preparado tecnicamente, mas não necessariamente reunia as habilidades para a gestão de pessoas. Então, era comum termos casos de líderes autoritários, com atitudes que hoje facilmente seriam classificadas como assédio moral. Houve uma mudança no mercado, saindo da lógica industrial para o modelo que temos hoje, e isso também exigiu uma mudança do perfil das lideranças. Hoje, fatalmente, eu não sei mais nem sou melhor que todos da minha equipe em suas áreas de atuação. É dever da liderança cercar-se de pessoas mais talentosas e com grande potencial. Antes, isso era uma ameaça, hoje é sinônimo de sucesso. O líder também passou de um papel de colocar a mão na massa o tempo inteiro, para um de ser mais estratégico.
Como as transformações no ambiente das empresas, nas rotinas de trabalho (híbrido/remoto) transformaram também as demandas por parte das lideranças?
Rafael – Eu lidero pessoas. Pessoas estão inseridas no contexto da sociedade. Então, qualquer mudança social ou de mercado impacta o comportamento das pessoas e exige que eu esteja preparado para reconhecer essa mudança, entender os impactos e adaptar mecanismos de gestão para a minha equipe. Acho que esse é o ponto principal. A liderança está em permanente adaptação, ainda mais neste mundo de hoje em que tudo evolui ou muda muito rapidamente. Quando eu comecei a trabalhar não existiam redes sociais. É claro que eu preciso entender que o comportamento das pessoas de hoje não vai ser igual ao que as pessoas tinham antes disso. O mesmo acontece com o trabalho híbrido/remoto. A sociedade mudou com a pandemia e não posso achar que não vai haver alterações no comportamento das pessoas no trabalho. Então, é preciso ter a cabeça muito aberta para atualizar os modelos mentais na mesma velocidade da sociedade.
No ambiente da comunicação e marketing, que habilidades mais específicas se aplicam para liderar?
Rafael – As habilidades de liderança são praticamente as mesmas para todos os setores. O que mais muda é o contexto, são os desafios. É preciso entender cada momento e buscar as melhores práticas para cada um. Momentos de crise pedem alta resiliência, controle da ansiedade e raciocínio rápido. Situações de muito sucesso demandam controle do ego e humildade. Novos desafios requerem pensamento estratégico, e assim por diante. Mas talvez espere-se mais da capacidade de comunicação com a equipe dentro da nossa área. E este é um ponto que cai naquele chavão do “casa de ferreiro, espeto de pau”. Problemas de comunicação com a equipe são muito comuns e cruciais para não atingir os objetivos.
Que tipo de líder é você e como o seu estilo de liderança foi se modificando ao longo do tempo?
Rafael – Procuro mesclar estilos, de acordo com o contexto. Acho importante combinar quatro dos perfis que o Daniel Goleman* usa como referência para liderança. O visionário, que é aquele que dá clareza em relação ao propósito e às prioridades; o democrático, estimulando a colaborar e tomar decisões em conjunto; o afetivo, que promove um ambiente de confiança e segurança psicológica; e o treinador, promovendo aprendizagem contínua e desenvolvimento individual e coletivo. E esse é um processo que vai se aprimorando com o tempo. Lá atrás, minha liderança era muito técnica, voltada para as competências que eu tinha mais segurança. Depois, comecei a entender a necessidade de delegar, dar autonomia com responsabilidade para as pessoas, e abrir espaço e tempo para exercer a liderança no aspecto comportamental, cuidar do desenvolvimento individual e coletivo. Hoje, a maior parte do meu tempo está alocada em atividades estratégicas de planejamento e de gestão de pessoas.
Com a rápida evolução do ambiente de negócios e tecnológico (leia-se IA impactando modelos de negócios, cargos e funções, demandas em geral), quais são as tendências atuais ou futuras em liderança?
Rafael – Creio que a humanização sempre estará na moda. Quanto mais soluções tecnológicas aparecerem, mais o contato humano será necessário, para contrapor. A máquina poderá ocupar diversas atividades do ser humano, mas sempre será necessário ter pessoas por trás, com necessidades de motivação, encaminhamento de carreira. E em um olhar otimista, vejo oportunidade para automatizarmos trabalhos operacionais, mas o componente humano é crucial para garantir sucesso e assertividade. Automatizamos tanto o atendimento telefônico, por exemplo, e, em muitos casos, tudo o que precisamos é falar com um humano, pois há complexidade demais envolvida nas nossas demandas.
* Daniel Goleman – Jornalista e escritor, escreveu para o The New York Times, em especial sobre avanços nos estudos do cérebro e das ciências comportamentais. Alguns de seus livros: Inteligência emocional; Liderança: A inteligência emocional na formação do líder de sucesso; Foco; Autoconsciência; Inteligência social: a nova ciência das relações humanas; A mente meditativa.