A Binder marcou presença no maior festival de criatividade do mundo, o Cannes Lions 2024, na 71ª edição, com alguns de seus principais executivos. Provocador de mais perguntas do que fornecedor de certezas, como define Marcos Apóstolo, sócio e diretor de criação da agência, o evento, este ano, mais uma vez, foi marcado pela força nas discussões em torno da tecnologia. A frase de boas-vindas “The Home of Creativity” no famoso “Palais des Festivals” (sede dos principais eventos em torno do festival) se mantém, segundo Apóstolo, motivo de orgulho ao provocar certo pertencimento a uma comunidade global que discute o valor das boas ideias e procura mantê-las no centro, não importando o teor das discussões – como a necessária regulamentação da IA.
“Mas, curiosamente, fico na dúvida se a comunicação em si ainda está no foco de Cannes. A tecnologia é a grande estrela. Será ela a ideia criativa?“, questiona Apóstolo.
Um dos principais pontos destacados por Glaucio Binder, sócio fundador da agência, foi a mudança na percepção da Inteligência Artificial (IA). Diferentemente do ano passado, quando a IA era vista como uma ameaça, este ano ela foi amplamente discutida como uma ferramenta valiosa, mudança que demonstra um amadurecimento na compreensão e aceitação da IA como um aliado no processo criativo, capaz de potencializar as capacidades humanas em vez de substituí-las.
Após impacto massivo da IA no festival do ano passado, temas que haviam ficado em segundo plano voltaram com força. Destaque significativo foi a discussão sobre a relevância e honestidade dos propósitos das marcas. Glaucio observa que a autenticidade nas campanhas e o alinhamento genuíno com causas sociais estiveram novamente no centro das atenções, sinalizando demanda crescente por transparência e integridade no posicionamento das marcas.
Glaucio identificou dois vieses na alta proporção de prêmios concedidos a campanhas que abordam questões sociais: a construção de cases vencedores a partir de problemas sociais reconhecidos pode ser mais fácil do que a criação de campanhas criativas para questões comerciais?
“Além disso, essa tendência pode favorecer o desenvolvimento de soluções que, embora impactantes, são menos aplicáveis no dia a dia“, observa.
Para ele, uma das apresentações mais inspiradoras foi a que reuniu três lideranças latinas femininas: Jessica Apellanis (Wieden+Kennedy México), a brasileira Joana Mendes e Eva Santos (Delírio, da Colômbia), compartilhando insights sobre o que impulsiona a alta criatividade em seus respectivos países, destacando a crescente influência e o reconhecimento da criatividade latino-americana no cenário global.
A vez dos storytellers
Já Lucas Daibert, sócio e diretor de estratégia da Binder, enxergou, a partir das discussões que acompanhou, a chegada do “momento dos storytellers“, em que os profissionais de comunicação serão os grandes responsáveis por dar sentido para as ferramentas de tecnologia, que estarão cada vez mais “embedadas” nos processos criativos.
“Não importa o tamanho do grupo de comunicação, todos estavam lá conversando sobre o futuro, e o fato é que, no cenário de hiperaceleração em que vivemos hoje, ninguém sabe ao certo qual será a realidade do nosso negócio lá na frente, para onde ele caminha. Mas o que ficou claro é que as pessoas farão a diferença, os profissionais. Porque, em algum momento, a tecnologia se tornará commodity, e a camada que os profissionais colocarão nos processos será o que fará a diferença“, destaca Daibert.
Segundo ele, o Cannes Lions ganhou tração no conteúdo, aproximando-se, em certa medida, de outros grandes festivais de inovação mundo afora ao oferecer farta programação de conversas dentro e fora do Palais, em hotéis e inúmeros espaços alternativos à beira-mar. O grande destaque no tradicional Palais, o centro de convenções que é o coração do festival, além de algumas palestras mais relevantes, são as grandiosas cerimônias de entrega de Leões, realizadas diariamente ao longo da semana sempre com bastante capricho e uma boa oportunidade para assistir aos cases premiados, também produzidos e apresentados de maneira cada vez mais sofisticada.
“O evento tomou conta da cidade de Cannes, com marcas oferecendo programações paralelas em inúmeras ativações, maiores e diversificadas em opções, ano a ano. O Palais se transforma, cada vez mais, em uma programação VIP, até porque é possível ver os trabalhos inscritos e premiados online“, observa.
Daibert também percebeu clara preocupação dos jurados de premiar cases que apresentaram resultados, fugindo dos eventuais fantasmas ou de estratégias de greenwashing, social washing e outros possíveis “washings“. E é preciso reconhecer ainda que, apesar da crescente presença de diversidade nos corpos de jurados, ainda se viu uma maioria maciça de homens brancos subindo no palco para coletar Leões. Segundo ele, a pauta da diversidade se manteve forte nos encontros e nas palestras, enquanto o tema do aquecimento global e das mudanças climáticas não apareceu com tanta força este ano quanto em outros festivais de inovação, como o SXSW.
Igor Binder, diretor de atendimento da agência, que foi pela primeira vez ao festival, destaca duas das missões primordiais do evento: ser um grande encontro global para conexões e reconexões entre pessoas; e estabelecer o “sarrafo” do trabalho criativo, ao distribuir os prêmios mais cobiçados do mercado global e, a partir disso, apontar para o futuro.
“Eu me dediquei a ver muitos cases inscritos e premiados, e volto com muita vontade de trazer Leões para a gente“, conclui.